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05/07/2013ㅤ Publicado às 11:11

Por Roberto Montezuma

Logo depois de formado, em meados da década de 1980, iniciei uma pós-graduação em Habitação e Cidades Democráticas na Architectural Association, em Londres. Já nas primeiras aulas, um fato me surpreendeu profundamente: a leitura de uma dissertação de mestrado sobre a construção da mais bela mulher de todos os tempos. Rigorosamente criteriosa, a dissertação dividia o corpo feminino em inúmeras partes e as seguia costurando, uma a uma, em busca da imagem da mulher perfeita. Os olhos da italiana Sophia Loren, a cor da íris da americana Elizabeth Taylor, os lábios da francesa Brigitte Bardot e assim sucessivamente, até saltar, da última página do bem escrito texto, para susto do leitor, um Frankenstein horrendo.

Lembro dessa experiência agora quando multidões vão às ruas no Brasil exigindo melhor transporte, educação, saúde, segurança, em suma, serviços urbanos de qualidade, além de respeito aos anseios e direitos da cidadania.

Para mim está mais do que claro que, na base dessas justíssimas reivindicações, está a péssima qualidade urbanística das cidades que temos visto serem construídas no Brasil há décadas, na completa ausência de um planejamento urbano capaz de compor um Projeto de Cidade democrática, inclusiva, integradora, construída por partes concatenadas em curto, médio e longo prazo.

Ao contrário da cidade planejada que precisamos, o que aconteceu nas metrópoles brasileiras, no Recife em particular, foi a construção desse monstro que hoje nos assombra. Com cada um procurando fazer “o seu melhor” do “lote para dentro”, terminou-se construindo uma cidade-Frankenstein, do “lote para fora”, que descontenta a todos.

Precisamos urgentemente reaprender, no Brasil, que as cidades são, por excelência, o chão dos confrontos e conflitos, das oportunidades e do exercício permanente da conciliação das forças sociais e econômicas. Para isso, não podem deixar de ser mediadas pela lógica irrecorrível dos sistemas espaciais urbanísticos: infraestruturais, ambientais e ocupacionais, que dão suporte estratégico contínuo ao desenvolvimento do organismo vivo e pulsante que é a cidade. Na ausência deles, o caos que vivemos hoje.

Depois de anos debatendo essas questões em diferentes palestras, seminários, aulas, projetos públicos e privados, no Brasil e no exterior concluímos, racionalmente, que cidade-Frankenstein não deveria interessar a ninguém. A nenhum cidadã, seja ele político, profissional, empreendedor de grande a pequeno porte. A nenhuma geração comprometida com legado às jovens e futuras gerações. Todos podemos ganhar muito e muito mais com um Projeto de Cidade brasileira consistente que nos permita aproximar de cidades mágicas e planejadas como são Paris, Amsterdam, Barcelona e Veneza. Fora disso, só nos resta o monstro que estamos vendo nas ruas…

Roberto Montezuma é arquiteto e urbanista, sócio da AFM Arquitetos e Urbanistas, professor de Projeto de Cidade, da UFPE, e presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Pernambuco – CAU/PE.

* Texto publicado na coluna Rede Gestão do dia 30 de junho de 2013, no Jornal do Commercio.

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